Será que somos todos propensos à corrupção?

Publicado em 13/07/2015

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A experiência inédita vivida atualmente pelo Brasil, de ver na prisão figuras poderosas dos negócios e da política, parece confirmar uma velha crença. A de que o poder corrompe, como se a corrupção fosse algo inerente à ocupação de altos cargos. O mesmo pensamento prevalece nos Estados Unidos. O país também presenciou presidentes de grandes companhias serem pegos em falcatruas que terminaram por destruir suas empresas e a poupança de milhares de pequenos investidores. Há um ponto, porém, ainda pouco pesquisado – o ambiente em que isso ocorre. Tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil, alguns desses desvios envolvem muitas pessoas e são presenciados ou pressentidos por outras inúmeras pessoas. Como podem perdurar por anos dentro das empresas e demorar tanto para alguém tomar uma medida? Este enigma ético levou a acadêmica americana Jessica Kennedy, da Escola de Administração da Universidade Vanderbilt, a duvidar da relação de mão única entre alto escalão e corrupção. Durante cinco anos, ela realizou inúmeros estudos dentro de empresas para detectar a origem do comportamento antiético. E chegou à conclusão que a relação entre poder e corrupção é muito mais tortuosa do que parece à primeira vista. E também mais surpreendente, como tudo que diz respeito à nossa mente. Em uma entrevista à Strategy+Business, publicada pela firma de auditoria PWC Strategy& LLC, a pesquisadora explicou sua hipótese. Para ela, a maioria das práticas antiéticas aflora, não a partir de uma pessoa, mas do grupo. A primeira constatação das pesquisas, segundo ela, mostra que somos mais propensos a mentir quando tomamos decisões em grupo do que individualmente. Já a segunda conclusão indica que, entre as pessoas de alto escalão – justamente as que tomam as decisões mais importantes - há uma tendência muito maior de aceitar o que o grupo recomenda do que entre as pessoas da base da pirâmide corporativa. Mesmo no caso de uma violação da ética. O PODER DO PERTENCIMENTO Isto significa que, que no topo da hierarquia, há menos pessoas dispostas a se opor ativamente a uma quebra de princípios. A ideia talvez explique o protagonismo de funcionários subalternos nas denúncias de corrupção. Acompanhar a manada não é exatamente a visão que temos de um corpo de executivos eficientes, ambiciosos e hiperativos. No entanto, quanto mais alto o status de uma pessoa dentro de um grupo, constatou a pesquisadora, mais ela se identifica com esse grupo. Aí entra o fator poder. É ele que estabelece a identificação dentro do grupo que compartilha esse poder.A palavra-chave, como se vê, é identificação.Quando as pessoas se identificam muito com um grupo, ficam mais inclinadas a aceitar suas normas e práticas e a vê-los como um fato positivo. Elas chegam a fundir sua identidade com o seu sentido de grupo. O oposto parece confirmar a regra - quanto mais se desce na hierarquia corporativa, mais fraca a identificação se torna. O fenômeno pode ajudar a entender um caso que extrapolou o ambiente de uma grande companhia. Um alto executivo, no cargo havia alguns anos e gozando de total confiança dos seus pares, realizou operações financeiras pouco comuns no país. Por um movimento do mercado, a artimanha se voltou contra a empresa, e a grave crise obrigou a sua venda a um concorrente. O diretor foi responsabilizado pelo prejuízo, como se tivesse cometido um ato isolado, e processado por... seu grupo de identificação. Em sua defesa, alegou que as decisões foram tomadas em conjunto e aprovadas pelo Comitê Executivo e pelo Conselho de Administração. Há um tom de surpresa e queixa na argumentação, como se tivesse sido abandonado e acusado por algo que não era tido como errado para o grupo. Ele ganhou a causa. QUAL O PESO DA LEALDADE E DA SATISFAÇÃO? Nas pesquisas, a identificação surgiu como um fator preponderante para explicar o comportamento de um grupo de alto escalão. Mas Jennifer Kennedy testou outras possibilidades, que demonstraram um pouco de influência. O senso de dever e lealdade também leva uma pessoa a se esforçar para obter resultados positivos para o grupo que a ajudou a ocupar uma posição de comando. Em algum momento, a pessoa passa a aceitar qualquer ação para garantir este sucesso do grupo, mesmo que represente uma quebra de princípios. Outro fator pesquisado foi o sentimento de satisfação por fazer parte de um time de elite e se este fato poderia justificar a aceitação de tudo o que vem do grupo. Contrariando a crença geral, não teve tanto peso quanto a identificação. O resultado parece demonstrar que não se trata de alguém fingir que não vê a ilegalidade, mas de realmente não perceber sua extensão. Em todas as variantes que fez de pesquisa, ela constatou que o alto escalão tende a ser menos rigoroso com a ética (ou mais complacente com a ilegalidade) do que o baixo escalão. O JEITO BRASILEIRO Esta hipótese vale para o Brasil ? Os resultados da pesquisa precisam ser olhados com algumas reservas e não poderiam ser aplicados aqui de forma absoluta. Há muitas diferenças de nuances entre a visão americana e a visão brasileira de ética. E também faz diferença o caminho de punição à corrupção seguido por cada país. A tese também não deve servir para justificar a corrupção em quantidades industriais que se vê no Brasil. O que a imprensa noticia no momento é pura formação de quadrilha, com presença de gente de fora, e não apenas um caso de grupo de identificação. Mas mostrar como o ambiente de trabalho contribui para a formação deste fenômeno pode ser útil para clarear a área sempre cinzenta das questões de ética no mundo corporativo. Com uma mentalidade prática de americana, a pesquisadora não deixa de sugerir soluções para enfrentar os dilemas levantados por sua pesquisa. Ela sugere três providências para as empresas: incluir pessoas de fora do grupo de comando para avaliar a qualidade ética das decisões; incentivar que pessoas de toda a empresa se manifestem quando perceberem que algo não está cheirando bem; e assumir, na presidência, que o comportamento ético é um objetivo inegociável. Diário do Comércio

Sobre o autor

Alberto Spoljarick Neto

Alberto Spoljarick Neto é o gerente de marketing e eventos da Associação Comercial e Industrial de Mogi Guaçu. Formado em Publicidade e Propaganda e Relações Públicas pela ESAMC, ele continua se aperfeiçoando em tendências de consumo de mercado e as aplicando para os empreendedores de nossa cidade.