É melhor você não enxergar somente o copo meio vazio
Publicado em 07/05/2015
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Na hora de pagar, o preço subiu. Na hora de receber, desconte os impostos altos. Parcelar e pegar dinheiro emprestado? Os juros estão nas alturas. Some-se a isso aquela sensação de que o emprego está ficando escasso e de que a economia permanecerá fraca neste ano. Está triste e sem vontade de investir e arriscar ao ler esse parágrafo? Cuidado.
Quem se identifica com essa sequência de frases não está totalmente errado: tudo isso acontece agora porque a economia passa por ajustes que prometem –no futuro- uma melhora em quase todos os indicadores. Mas o cuidado aqui diz respeito ao sentimento de pessimismo – que não deve ser tão forte a ponto de se pensar que o amanhã será tão ruim e de que o melhor é paralisar as decisões financeiras.
Esse sentimento já aparece nos diversos indicadores de confiança da economia. Pesquisa conduzida pela Duke University, Fundação Getúlio Vargas e CFO Magazine mostra que o grau de pessimismo dos executivos de finanças brasileiros é o mais elevado do planeta. Entre consumidores, o otimismo continua em queda, segundo o Índice Nacional de Confiança (INC) da Associação Comercial de São Paulo (ACSP).
Pessimismo excessivo é o oposto do otimismo excessivo, que se traduz, no campo das finanças comportamentais, pela crença de que tudo vai bem e só continuará melhorando. Em um cenário assim a pessoa toma riscos sem perceber porque acredita que a tendência geral é a de ganhar sempre. Esse sentimento é comum em uma bolha imobiliária, por exemplo, que é inflada cada vez mais pela crença geral de uma valorização sem limites.
A oposição à euforia do “tudo vai dar certo” também faz mal para o bolso. Expõe a pessoa a outras armadilhas de comportamento, como a ancoragem (que é se apegar a um número e a uma informação) e o de manada (semelhante à do mundo animal em que todos correm em uma só direção).
De um lado, ser pessimista pode ajudar a proteger o patrimônio, porque a tendência natural em uma crise é buscar a proteção e o conservadorismo.
“O conservadorismo não é de todo ruim porque a pergunta é simples: que aplicação vai pagar 12% ao ano nesta época? A mais conservadora. É o momento em que temos de pensar no custo de oportunidade”, diz William Eid, coordenador do Núcleo de Estudos em Finanças Comportamentais do Centro de Estudos em Finanças da Fundação Getúlio Vargas (NFC/GVCEF).
Por outro lado, o pessimismo excessivo faz com que a pessoa seja dominada pelo medo e paralisa suas decisões. Com isso, vem uma grande preocupação com os riscos –algo que o mesmo indivíduo nem dá bola quando surfa na onda otimista.
Otimismo e pessimismo – em seus extremos – levam as pessoas a tomar decisões que não estão de acordo com a realidade.
Vera Rita de Mello Ferreira, psicóloga econômica e membro do Núcleo de Estudos Comportamentais da Comissão de Valores Mobiliários (NEC-CVM), diz que cada um deve tomar contato com sua própria realidade --até mesmo para que um cenário difícil na economia não pareça ainda mais negativo.
Quem procura avaliar a própria situação pode se dar conta de que ela não está tão ruim assim quanto a do vizinho. E acaba investindo porque os preços são mais atrativos numa crise.
Isso é importante porque o pessimismo excessivo -assim como seu oposto- contamina a todos: consumidores deixam de comprar, o banco deixa de emprestar, o empresário deixa de receber, de vender e de investir. É um desânimo geral e gera um círculo vicioso mesmo. E o efeito é de dominó.
Adriana Rodopoulos, sócio-fundadora da Oficina de Escolhas, diz que, de certa maneira, colhemos agora os resultados de um período de otimismo excessivo, no qual o governo gastou muito e a população teve acesso fácil ao crédito.
“Agora todos se deslocam para o outro extremo, o pessimismo. Mas o fato é que a economia ainda não está no buraco e medidas estão sendo tomadas. Na minha opinião, ainda falta muito para se chegar ao fundo do poço. O problema é que as pessoas estão antecipando essa realidade”, afirma Adriana.
Vera Rita diz que é preciso buscar um contato com a realidade para não desperdiçar a chance de conhecer o que está acontecendo e, deste modo, enxergar saídas para possíveis problemas e, até mesmo, vislumbrar oportunidades.
“É preciso olhar a própria realidade e ver como o dinheiro está aplicado. Está na hora de se perguntar se o dinheiro não está dando para pagar as despesas agora ou se nunca deu”, recomenda Adriana.
FUJA DA MANADA
O sentimento de copo vazio paralisa as decisões, fazendo com que a pessoa não queira aplicar recursos ou colocar esforços ou esperança em nada. Desta maneira, as pessoas decidem agir da mesma forma, em um movimento que os especialistas em finanças comportamentais chamam de manada.
“É natural. Quando o crédito seca, há dificuldade de pensar de que outro modo é possível fazer as mesmas coisas e ter os mesmos projetos. Mas perceber que esse comportamento é exagerado também é arriscado porque tomar uma decisão diferente do que os demais estão tomando é nadar contra a maré”, afirma Vera Rita.
Em outras palavras, ir contra a manada é difícil porque é natural ao ser humano observar o que o outro está fazendo. Afinal, a sensação de conforto é maior quando uma pessoa erra junto com um grupo do que solitariamente.
“É um jeito da gente não se responsabilizar. Se todos fizeram bobagem, tudo bem. É um consolo mesmo”, explica Vera.
Ela diz que, numa onda de pessimismo, é preciso ter a serenidade de perceber que o risco existe e que o jeito de sair da paralisia é pensar em encontrar saídas. “Sempre existem oscilações. A atual não foi a primeira e nem a última. A vida tem que continuar”, alerta.
CUIDADO COM AS ÂNCORAS DE PREÇOS
William Eid, da FGV, diz que outro comportamento forte em tempos de crise é o da ancoragem, ou seja, prender-se a um determinado número ou informação. Esse comportamento é comum em pessoas que investem no mercado de ações.
Digamos que um investidor comprou ações da Petrobrás a R$ 2, o papel chegou a valer R$ 40 e, agora, R$ 13.
“Há muitos investidores que querem vender a ação, mas acham que não vale a pena porque o preço do papel chegou a ser de R$ 40. Ou seja, em tempos de crise, as pessoas se ancoram em números elevados”, diz.
A ancoragem é também um comportamento que empresário têm em relação ao preço. “Ele cobra por um produto ou serviço R$ 700, mas o concorrente vende por R$ 180. Em tempos de crise terá de calcular bem, saber a margem de lucro e pesquisar a concorrência. É preciso deixar para trás os preços praticados na bonança e entender que o patamar muda na crise porque o consumidor pesquisa mais”, afirma Eid.
De modo semelhante, Adriana diz também ser comum que o consumidor se ancore na oferta ou no menor preço, esquecendo até de alguns detalhes. “Quem vai a diversos supermercados para pagar o menor preço, mas considera o custo de deslocamento e o tempo gasto pode perceber que, em termos financeiros, não é compensador”, afirma.
O coordenador do NFC da FGV diz que em tempos de crise econômica o empresário deve fazer análises mais aprofundadas do mercado em que atua para encontrar nichos que continuam sendo bons nesse período.
“Quem está pessimista porque investiu e fracassou deve buscar saídas criativas", diz Eid. "A maioria dos empreendedores que conheço perderam tudo porque não tiveram cabeça fria para pensar em estratégias alternativas.”
Diário do Comércio
Sobre o autor
Alberto Spoljarick Neto
Alberto Spoljarick Neto é o gerente de marketing e eventos da Associação Comercial e Industrial de Mogi Guaçu. Formado em Publicidade e Propaganda e Relações Públicas pela ESAMC, ele continua se aperfeiçoando em tendências de consumo de mercado e as aplicando para os empreendedores de nossa cidade.